Sim, o movimento persiste! :)
Em um período extremamente difícil para o nosso país, e também em um momento em que todes estamos inundados de demandas por todos os lados, sejam de trabalho ou de família, financeiras ou afetivas, sociais ou pessoais, de alguma maneira encontramos forças para prosseguir, celebrando setembro como o mês da bicicleta e propagando aos quatro ventos da cidade nossas mídias livres. Yeah!
Mídia livre sim! O ArteBiciMob é uma mídia na forma de um festival. Uma mídia em conceito expandido. Promovido desde 2007, esse imaginário poético celebra uma Curitiba pouco observada, oferecendo a qualquer pessoa que se dispuser a lhe emprestar um pouquinho de atenção, amostras de novas possibilidades de mediar a cidade. E nesse contexto, a atividade mais importante é a celebração da organicidade das relações coletivas.
A marcha das bicicletas é, como sempre, o momento de maior catarse coletiva. Estar nas ruas da cidade e poder pedalar sem ter que ficar ouvindo seu GPS interno gritar em seu ouvido o tempo todo “Atenção, perigo!” é mágico demais… e são nesses momentos que nos damos conta do quanto estamos cansados de nossa invisibilidade. E, principalmente, cansados de sermos desrespeitados.
Me pergunto sempre o que leva uma pessoa que está sentada confortavelmente em seu carro a direcionar tanto ódio a um ciclista que encontra em seu caminho. Muitos inclusive argumentam que “atrapalhamos o trânsito”. Atrapalhamos mesmo? A ver…
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transitivo direto e intransitivoser um obstáculo a; perturbar, estorvar, impedir.
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transitivo diretoagir de maneira importuna, impedindo as ações de (outrem).
Então perturbamos, estorvamos ou impedimos exatamente o quê? Alguns podem dizer: estorvamos a passagem de carros. Ok. Mas e os outros veículos que estão na rua? Eles também não “estorvam” a passagem dos outros carros? Quando há um congestionamento, por que ninguém questiona os outros carros também estarem na rua? Por que é justo a bicicleta que não deveria estar na rua? A resposta que geralmente vem é: a bicicleta atrapalha porque tem pouca velocidade. E é aí que a coisa pega: por que é considerado tão ruim ter que diminuir a velocidade? Nem que seja somente por alguns momentos, até se ultrapassar o ciclista? Por que temos essa cultura de se fazer tudo com tanta pressa? Por que temos essa necessidade de pisar forte no acelerador? Por que xingamos quem não está pisando? Quem não está poluindo o ar que respiramos? Por que temos tanta raiva de quem não está se deslocando tão confortavelmente quanto nós? E por que maldizemos tanto quem nos obriga a repensar nosso modo de deslocamento na cidade?
Penso que é por aí que podemos começar a esboçar uma resposta: porque as pessoas não querem ter que pensar sobre isso. Já têm tantas coisas com que se preocupar, e ainda mais isso? Então fica muito mais fácil simplesmente culpar os ciclistas por esse “atrapalho”. Dá menos peso na consciência nos rotularem de “talibikers” que querem que todes louvem incondicionalmente uma deusa única e toda poderosa, a bicicleta. Somos os “classe média” que não tem nada mais importante pra fazer que ficar pedalando pela cidade e questionando o status quo. Somos os “pobretões” que não tem grana pra comprar um carro. Somos os invisíveis que teimam em querer sair da invisibilidade. Ah, quanta ousadia! Que petulância!
Se observarmos a cidade como quem observa a um organismo vivo, percebemos que suas artérias, veias e capilares nada mais são que seus caminhos, ruas e avenidas. E tudo que por estes meios se desloca é o seu sangue, mantendo a vida desse ser vivo no que se refere ao transporte de tudo que seja necessário para sua sobrevivência. Mas o que acontece a um organismo quando o sangue corre rápido demais nas veias? O que acontece com a cidade quando a alta velocidade é uma constante no seu fluxo de vias?
A hipertensão é uma doença insidiosa. Ela não demonstra sintomas até que o organismo já esteja bastante fragilizado. Portanto, se já estamos sentindo os efeitos da hipertensão na cidade, é porque a doença já está em estágios bastante avançados. Então que tal finalmente se prestar atenção a isso antes que a dor passe a ser insuportável para TODAS e TODOS?
Precisamos curar nossas cidades, ou melhor, o nosso planeta, tanto quanto precisamos curar a nós mesmos. Mas infelizmente, tem muita gente que acha que não faz parte disso. Pior, acha que não tem responsabilidade alguma sobre isso. Quem mais teria poder para agir, está escolhendo somente escapar. Não se vêem mais como parte desse ecossistema, como co-responsáveis por tudo que está acontecendo. Preferem pensar que terão uma vida melhor dentro de ambientes absurdamente controlados, fora daqui, longe desse planeta. Acho essa tendência perigosamente parecida com uma história muito doida, mas que faz muito sentido: a do surgimento de Atlântida. Se pensarmos bem, por mais que essa teoria pareça extremamente absurda, o que teríamos a perder se escolhêssemos nos reconectar com a energia do amor e parássemos de ser idiotas uns com os outros?
Enfim… seja bem vindo, setembro!
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